segunda-feira, 19 de março de 2012

O mandado que o MP não preparou

A "Folha Online", a que temos acesso pelo site UOL, publicou notícia interessante narrando o caso de um suspeito de homicídio que teria tentado se entregar duas vezes, assumindo a culpa pelo crime. Mas não teria conseguido ser preso.

Veja a íntegra da notícia clicando aqui.

O repórter informa que a Polícia se justificou, dizendo que fez sua parte ao pedir o mandado de prisão. E diz, ainda: "Já a promotora responsável pelo caso, que deveria ter feito o mandado, afirmou a um telejornal da região que ainda não analisou o pedido por causa do grande volume de processos que correm no fórum local" (grifo nosso).

Pode até ser que a promotoria de Campo Mourão, local do fato, esteja mesmo assoberbada de trabalho. Mas o repórter deve ter se equivocado ao narrar o fato, pois nem se a promotoria quisesse e estivesse sem mais nada para fazer poderia "ter feito" esse mandado.

Afinal, quem manda, quem dá ordens e expede mandados em nosso sistema processual é só a autoridade judiciária. E uma das grandes conquistas do processo penal moderno é a adoção do sistema acusatório. Esse sistema se opõe ao inquisitório, caracterizado por serem acusação e julgamento feitos pelo mesmo órgão. Já no sistema acusatório um órgão é responsável pela acusação, o Ministério Público, e outro pelas decisões, o Judiciário.

Assim, o que a promotoria poderia fazer, independentemente do pedido feito pelo Delegado, representar ao juiz, era postular a prisão cautelar do suspeito, caso entendesse cabível. E sorte do réu - e de toda a sociedade - que o responsável pela acusação não é, também, o mesmo que decide a causa!

Na foto, a Inquisição católica e sua notável parcialidade.


Finalmente, por mais se indignem os que acham absurdo o fato de não ser preso alguém que está se entregando e confessando, vão aí algumas lembranças. Afinal, a confissão só pode ter valor se feita perante o juiz, e isso tem razões de ser: e se o suspeito confesso estiver mentindo? Ele pode estar sendo coagido ou se movendo por sentimentos para tentar livrar a culpa de alguém. Ora, é melhor ter um pouco de parcimônia e não sair prendendo alguém cuja culpa ainda não foi apurada, pois é necessário um processo, em que a culpa seja devidamente apurada, não bastando a confissão para se chegar a alguma conclusão.

E vige em nosso sistema constitucional o princípio da presunção de inocência, lembra? Essa é uma importante conquista do Estado Democrático de Direito, e a prisão cautelar só pode acontecer se for uma necessidade processual - ou seja, não popde ter relação com qualquer juízo de presunção de culpa que se queira fazer.

Ao repórter concedemos nosso voto de compreensão. O erro dele não foi nada crasso e se trata até mesmo de uma confusão normal. Este Blog defende, por essas e muitas outras, que um pouquinho de Direito deve ser ensinado com urgência nos Ensinos Básico e Médio, pois é direito das pessoas saber o mínimo sobre as leis que os governam.

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